domingo, 10 de julho de 2011
Os Nove Estágios da Concentração Meditativa - (Thich Nhat Hanh)
The Heart of the Buddha's Teaching
"Existem nove níveis de concentração meditativa. Os primeiros são os quatro dhyanas, que são concentrações no reino da forma [sânsc. rupadhatu, rupaloka]. Os cinco níveis seguintes pertencem à dimensão sem forma [sânsc. arupadhatu, arupaloka]. Quando praticamos o primeiro dhyana, ainda estamos pensando. Nos outros oito níveis, o pensar dá lugar a outras energias. A concentração na dimensão sem forma também é praticada por outras tradições, mas fora do buddhismo sua finalidade geralmente é a de escapar do sofrimento e a de não atingir a liberação, que surge quando o sofrimento é compreendido. Quando você usa concentração para fugir de si mesmo ou de sua situação, está praticando a concentração errônea. Às vezes, precisamos escapar de nossos problemas para termos um pouco de alívio mas, mais cedo ou mais tarde, será preciso retornar e enfrentar aquilo que evitamos. A concentração mundana procura a fuga. A concentração supramundana busca a verdadeira libertação.
Praticar o samadhi é viver com profundidade cada momento que nos é dado. Samadhi significa concentração. Para podermos nos concentrar, temos de estar conscientes, totalmente presentes e conscientes do que acontece. A atenção plena gera a concentração. Quando estamos profundamente concentrados, isso significa que estamos absorvidos no momento. Nos tornamos o momento presente. É por isso que o samadhi às vezes é traduzido como "absorção". A atenção plena correta e a concentração correta nos elevam acima dos reinos dos prazeres dos sentidos e dos desejos, tornando-nos mais leves e mais felizes. Nosso mundo já não é tão grosseiro e pesado — o reino dos desejos [sânsc. kamadhatu, kamaloka] —, mas é o reino da materialidade sutil, ou o reino da forma [sânsc. rupadhatu, rupaloka].
No reino da forma, existem quatro níveis de dhyana. Através desses quatro níveis, a atenção plena, a concentração, a alegria, a felicidade, a paz e a equanimidade continuam a crescer. Depois do quarto dhyana, o praticante penetra em uma experiência mais profunda de concentração — os quatro dhyanas sem forma — em que é possível enxergar a realidade com maior profundidade. Aqui, o desejo sensual e a materialidade revelam sua natureza ilusória e deixam de ser obstáculos. A pessoa começa finalmente a enxergar a natureza impermanente, impessoal e interdependente do mundo fenomênico. A terra, a água, o ar, o fogo, o espaço, o tempo, o nada, e as percepções, são todos interdependentes, necessitam uns dos outros para existir. Nada pode existir por si mesmo, independente do resto.
O objeto do quinto nível de concentração é o espaço ilimitado. Quando começamos a praticar este tipo de concentração, tudo parece ser espaço. Mas à medida que aprofundamos a prática, vemos que o espaço na verdade é composto de elementos "não-espaço", como terra, água, ar, fogo e consciência, e só existe neles. Considerando-se que o espaço é apenas um entre os seis elementos que compõem todas as coisas materiais, concluímos que ele não tem existência independente. De acordo com os ensinamentos de Buddha, nada tem existência separada. Portanto, o espaço é tudo o que é interdependente, sendo totalmente dependente dos outros cinco elementos.
O objeto do sexto nível de concentração é a consciência ilimitada. Inicialmente, vemos apenas consciência em tudo, mas aos poucos começamos a perceber que a consciência também é terra, água, ar, fogo e espaço. Tudo o que é verdadeiro em relação ao espaço também é verdadeiro em relação à consciência.
O objeto do sétimo nível de concentração é o nada. Com a percepção normal, vemos flores, frutas, bules e mesas, e achamos que eles existem independentemente uns dos outros. Mas quando observamos essa realidade mais profundamente, vemos que a fruta está dentro da flor, e que a flor, a nuvem e a terra estão dentro da fruta. Ao ultrapassarmos as aparências externas ou sinais, chegamos à "ausência de sinais". Primeiro pensamos que os membros de nossas família são separados uns dos outros. Você é como é porque eu sou como sou. Percebemos a conexão íntima que existe entre as pessoas, e passamos a funcionar além dos sinais. Antigamente chegávamos que o universo fosse povoado por milhões de entidades separadas. Agora entendemos a total "irrealidade dos sinais".
O oitavo nível de concentração é um nível onde não há nem percepção nem ausência de percepção. Reconhecemos que tudo é produzido por nossas percepções, que são, ao menos parcialmente, incorretas. Assim, entendemos que não devemos acreditar inteiramente em nossa forma anterior de ver o mundo, e buscamos um contato mais direto com a realidade. Certamente, não podemos nos impedir de perceber, mas agora pelo menos já sabemos que a "percepção" significada a percepção de um sinal, uma vez que já não mais acreditamos na realidade dos sinais, nossa percepção se transforma em sabedoria. Ultrapassamos os sinais (não-percepção), mas não nos transformamos em seres desprovidos de percepção (sem não percepção).
O nono nível de concentração chama-se cessação. Cessação, neste sentido, significa a cessação da ignorância contida em nossas sensações e percepções, e não a cessação das sensações e percepções em si. É aqui neste nível de concentração que emerge o insight, ou verdadeira compreensão.
(Thich Nhat Hanh. The heart of the Buddha's teaching - transforming suffering into peace, joy, and liberation: the four noble truths, the noble eightfold path and other basic Buddhist teachings. Broadway Books: New York, 1999.)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário