domingo, 6 de março de 2011

Renascer para a própria vida - (Thays Prado; Revista Bons Fluidos)



"Ao aplicar a técnica de respiração conhecida como Renascimento, tomamos consciência de velhos padrões de comportamento e ficamos mais livres para viver em um estado de presença e expansão.


Desde muito cedo aprendemos que as opiniões dos outros são mais importantes do que nossa própria experiência. Caiu? Não, não doeu, diz o adulto. O amigo lhe roubou a bola? Ora, você precisa aprender a dividir. Está triste? Homem não chora. Está com raiva e quer gritar? Menina educada não faz isso. Quase ninguém escapa dos velhos clichês que vão moldando a vida de cada um de nós. Pais, professores, livros didáticos, líderes religiosos, programas de TV estão sempre a nos dizer o que devemos ou não sentir, fazer, viver e assim por diante. Dessa maneira, passamos a classificar o mundo em duas categorias: o certo e o errado.

E daí não é difícil chegar à conclusão de que, infelizmente, uma porção de coisas precisa ser deixada debaixo do tapete, se quisermos realmente ser aceitos socialmente. E de tanto esconder do mundo e de nós mesmas certos sentimentos e pensamentos -- naturais em qualquer ser humano -- vamos nos afastando das sensações mais legítimas. No entanto, ao reprimir uma parte nossa, de algum modo isso fica registrado em nosso corpo e em nossa memória. “Tudo aquilo a que resistimos, persiste”, afirma o terapeuta Maurício Bastos, do Espaço Integração, em Cotia, São Paulo, que desenvolve um trabalho baseado na técnica do Renascimento. Com isso, começamos a criar padrões de comportamento, ou seja, a dar as mesmas respostas sempre que uma situação parecida acontece.

Segundo Khalis Chacel, fundador do Instituto de Renascimento de São Paulo, juntamente com sua mulher, Tárika Lima, o estabelecimento de padrões de comportamento automatizados pode ocorrer basicamente de duas formas: ou passamos por uma experiência muito intensa, uma espécie de trauma, ou vivenciamos, repetidas vezes, uma situação semelhante, que também deixa seu registro e, nos dois casos, suprimimos ou rejeitamos sentimentos, emoções ou pensamentos ligados àquele fato. É por meio desse mecanismo que uma vítima de acidente de trânsito na adolescência, por exemplo, pode passar o resto da vida sofrendo tensão corporal todas as vezes que entra em um carro. Ou ainda: uma mulher pode se sabotar sempre que vislumbra a possibilidade de uma relação amorosa dar certo, pois mantém a crença de que logo será abandonada, tendo por base seus primeiros relacionamentos.

Independentemente de os padrões serem positivos ou negativos, eles nos dizem que estamos usando referências antigas para viver uma situação que, se olharmos bem, é completamente nova. Afinal, este momento, aqui e agora, nunca aconteceu antes em toda a nossa existência.


Mudança essencial
Por mais incrível que possa parecer, segundo Chacel, o modo como absorvemos o ar está diretamente relacionado à maneira como buscamos novas conquistas na vida; fala de nosso entusiasmo diante do novo e de quanta disposição temos para alcançar um objetivo. Por outro lado, o processo inverso revela nossa capacidade de nos entregar, de desfrutar o que conquistamos, de relaxar e confiar. “Pessoas com dificuldade de conseguir o que desejam, de se virar no mundo ou que acham a vida pesada normalmente têm a inspiração prejudicada. Já aquelas que se sentem deslocadas, tímidas ou tensas, ou ainda as que se julgam culpadas por terem o que têm podem apresentar dificuldades com a expiração”, afirma.

Bastos acrescenta que “à medida que oxigenamos conscientemente nosso corpo e, principalmente, nosso cérebro, vamos alterando as sinapses, ou seja, as comunicações entre os neurônios, que tinham um padrão repetitivo e condicionado e passam a fazer novas conexões. Assim, podemos desenvolver uma habilidade mais criativa no modo como vivemos, uma permissão para o novo, um não reagir contra e, sim, um acolhimento ao que está acontecendo agora”.

A boa notícia é que a sugestão do especialista pode ser colocada em prática graças à técnica conhecida como Renascimento. “Mais do que rotular os clientes de acordo com seus padrões respiratórios, procuramos auxiliá-los a sair do estado de contração para o de expansão, por meio de uma inspiração mais ampla e de uma expiração mais relaxada”, diz Chacel. “Essa alteração nos proporciona prazer, bemestar, vitalidade e confiança para continuarmos o processo de desenvolvimento pessoal.”

Na realidade, o Renascimento nos ajuda a recuperar nosso estado natural, com uma respiração solta, fluida e sem tensões. “Crianças bem pequenas e mesmo animais que não tenham sofrido traumas são livres, expansivos. Só nós estamos aqui nos preocupando com tantas coisas”, afirma Chacel.


Passo a passo

Para alcançar novamente esse estado, o renascedor (terapeuta que trabalha com a técnica Renascimento) auxilia o paciente a realizar uma respiração específica durante algum tempo -- normalmente, uma sessão dura cerca de uma hora, mas isso pode variar bastante. Ela pode acontecer individualmente, em pares ou em grupos, dentro de um consultório, de uma piscina, ou até mesmo em contato com a natureza. O número mínimo de sessões é definido em conjunto, pelo terapeuta e o paciente. Alguns renascedores utilizam a técnica de maneira catártica, mas, no Instituto de Renascimento de São Paulo, Khalis Chacel e Tárika Lima optam por uma abordagem suave, integrada a conceitos meditativos e a filosofias orientais. Na visão do casal, o relaxamento é importante para que o paciente possa acompanhar o que acontece durante a sessão e desenvolver mais percepção e consciência sobre si mesmo. Para escolher um terapeuta, a dica é marcar uma sessão e sentir se você tem afinidade com a abordagem realizada.

Seja como for, o conteúdo das sessões é semelhante. Deitado ou sentado, o paciente é convidado a “respirar grande”, o que significa deixar sua inspiração pelo menos duas vezes mais ampla do que ela costuma ser no dia a dia. Em momentos em que queremos evitar algum sentimento, emoção, ou mesmo uma situação externa, tendemos a tensionar e prender a respiração. Quando a ampliamos, automaticamente, nos tornamos mais aptos a entrar em contato com o que vivenciamos. E não é só isso. Essa nova forma de trazer o ar para dentro melhora o humor, garante doses extras de tranquilidade para lidar com as questões que aparecem no decorrer do dia, mais disponibilidade para sorrir, aprender e encarar a vida como uma oportunidade infinita de trocas, experiências e aprendizados.

Como a respiração curta costuma gerar contração corporal e tensão mental, com um fluxo de pensamentos acelerado ou fixo em um único pensamento repetitivo, a segunda orientação do renascedor é que o paciente relaxe. “Ao perceber que a contração é involuntária, mas que o relaxamento depende de nossa vontade para acontecer, e que podemos aprender a soltar o corpo, deixamos de gastar energia nos contraindo e paramos de reforçar qualquer padrão de medo, dor ou trauma”, diz Chacel.

A terceira orientação é observar a prática sem julgá-la. Isso porque, enquanto usamos a técnica, é possível que surjam pensamentos, sentimentos, emoções, imagens, sensações físicas ou lembranças. O importante é continuar respirando e acolher qualquer coisa que venha, sem brigar, tentar interpretar ou reviver o que está acontecendo. Chacel lembra que enquanto respiramos nossa mente continuará em atividade. Afinal, sua função é mesmo pensar. “Não tente evitar os pensamentos”, diz ele. “Adotamos uma atitude de não interferência, como se assistíssemos a um filme, em que acontecem sons, imagens, mas escolhemos não conversar sobre isso, ficamos quietos, como se disséssemos ‘aham’ para qualquer coisa que venha.”

Ensinados esses três elementos fundamentais para o Renascimento, o paciente começará a respirar grande, pela boca ou pelo nariz, enchendo os pulmões de ar até a parte alta do peito. Também é importante emitir um som do fundo da garganta, semelhante a um sussurro, e manter a respiração conectada ou circular, quer dizer, sem pausas entre a inspiração, a expiração e a inspiração seguinte. Durante a inspiração, a atitude é ativa, pois trazemos o ar para os pulmões. Já na expiração, a atitude é passiva, o corpo relaxa e o ar sai naturalmente, sem que nenhum esforço seja necessário.


Consciência e integração
Durante uma sessão de Renascimento nesses moldes, o foco não está em tentar entender por que determinada sensação apareceu e não outra, fazer uma relação de causa e efeito entre o que aconteceu na infância e a imagem que surgiu, ou se livrar de um determinado trauma. O mais importante é, simplesmente, se entregar à experiência e acompanhar o que quer que aconteça, exatamente como é. Em vez de gastar tempo e energia evitando que pensamentos, sentimentos ou lembranças desagradáveis surjam, apenas dirigimos nossa atenção ao que está acontecendo, sem resistir. Com essa atitude, a tendência é que aquilo logo se dissolva e se transforme em algo novo. “Naquele momento, aquele incômodo -- junto com um pensamento que surgiu e a sensação que veio depois -- pode fazer sentido e eu me dou conta, por exemplo, da maneira como tenho de agir. É a habilidade de observar as reações do meu corpo agora, os pensamentos e sentimentos surgindo, que chamo de consciência, e não as explicações mentais sobre isso”, diz Chacel. “Independentemente do conteúdo, o fato de se dar conta, em si, já é muito rico. E a partir disso, o corpo encontra um novo fluxo, um novo caminho de expansão.”

Afinal, quando se escolhe, deliberadamente, ficar no momento presente, com o corpo solto, a respiração grande e a mente livre, o que estiver preso ou reprimido em qualquer um desses níveis não tem mais como se manter. Aquele padrão de comportamento, aquela velha tensão, aquele jeito antigo de se organizar e lidar com a vida se desestruturam e a energia volta a fluir livremente.

Assim, ao término de uma sessão, a intenção é que o paciente tenha uma sensação de profundo relaxamento, bemestar e vitalidade. A esse estado dá-se o nome de integração, que significa que ele se tornou consciente de alguma coisa que havia sido represada ou suprimida e que agora foi acolhida.

Para que determinado conteúdo seja acolhido e reintegrado, não é necessário voltar, mentalmente, ao momento em que o trauma aconteceu ou ao primeiro episódio que nos causou dor, raiva ou sofrimento. Muitas vezes, durante o Renascimento, nosso sistema interno se reorganiza sem que haja qualquer lembrança associada, simplesmente pelo fato de estarmos respirando de maneira relaxada e sem julgamentos. “A consciência em si é o grande agente transformador”, afirma o terapeuta Maurício Bastos, do Espaço Renascer.

A psicóloga Patrícia Cuocolo, que trabalhou nos últimos cinco anos com Renascimento no Espaço Integração, diz que a técnica auxilia os pacientes a sair de um entendimento puramente mental e a entrar em contato com seus sentimentos, gerando a possibilidade real de transformação ao colocar a energia vital em movimento.

 
Um novo estado de ser

Os benefícios da prática do Renascimento variam de uma pessoa para outra, mas, em linhas gerais, quase todos os pacientes relatam terem sensações de relaxamento profundo, alívio, bem-estar, leveza, diminuição de medos e de ansiedade, aumento do prazer de viver e do grau de felicidade, bom humor, delicadeza e paz interior.

Em termos físicos, a respiração fica mais fluida e torna-se mais fácil perceber quando não estamos respirando bem. O funcionamento do corpo de um modo geral também melhora. Emocionalmente, passamos a ter mais fluidez nas trocas com outras pessoas, permitindo-nos sentir o que quer que seja, sem nos perdermos nos dramas da vida. Há ainda ganhos mentais, como o aumento do potencial cognitivo e da perspicácia.

Maurício Bastos diz que a técnica ainda expande nosso potencial criativo, melhora a qualidade de nossas escolhas na vida e nas relações interpessoais. “A respiração é o grande veículo para a intimidade e a âncora para vivermos no momento presente, no campo das infinitas possibilidades.”

A nutricionista Renata Pinotti, de 32 anos, que já participou do workshop de formação oferecido pelo Instituto de Renascimento de São Paulo, conta que essa foi uma das experiências mais incríveis que ela viveu. “Descobri um lugarzinho dentro de mim que eu não sabia que existia, um lugar de amor, onde você consegue encontrar a solução para os seus problemas com calma e tranquilidade, apenas respirando.”

Sempre que está estressada ou mesmo fisicamente doente, Renata pratica a respiração circular e sente que seu corpo consegue se reequilibrar com muito mais facilidade. Ela ainda revela que seu jeito de olhar para a vida ficou totalmente diferente. “Estou menos crítica e dura comigo mesma. Tenho sido mais compreensiva com meus erros e menos impulsiva, consigo dar uma proporção mais real para os problemas e reagir de maneira mais consciente.”

O radialista Bruno Bock, de 26 anos, diz que o Renascimento o ajudou a descobrir que a vida é muito mais do que aquilo que costumamos experimentar. “Aprendi que ser feliz não está em movimentos externos e, sim, no que realizamos interiormente.”

Ele, que já perdeu as contas de quantas vezes fez os módulos básico e avançado da formação em Renascimento, conta que sempre volta das vivências muito mais sensível. “É aí que você percebe quanto estava anestesiado, em desequilíbrio. As pessoas estão malucas quando acham que a vida que levam é felicidade. Eu digo: você não sabe aonde dá para chegar.”

Chacel alerta, porém, que o Renascimento não promete uma solução mágica ou uma vida sem novas frustrações. “Muitas vezes, adquirir mais consciência e um estado de expansão significa perceber que não dá mais para continuar em um casamento ou que o emprego atual se tornou insuportável”, diz. “Mas, ainda assim, o caminho é em direção a um estado de mais liberdade, e liberdade significa ter, pelo menos, uma segunda opção.”

“A maioria das pessoas tem a noção de que a respiração é, simplesmente, um mecanismo de sobrevivência, algo necessário e inevitável. No Renascimento, vemos a respiração não apenas como nossa maior riqueza, mas como uma grande alegria e diversão”, Khalis Chacel, fundador do Instituto de Renascimento de São Paulo.


Para fazer em casa
É recomendado que a prática do Renascimento seja realizada na presença de um terapeuta, porque durante a respiração pode ser que você precise de ajuda para lidar com sentimentos, sensações, pensamentos ou lembranças que, por ventura, surgirem. No entanto, existem alguns exercícios com respiração conectada – ou seja, sem pausas entre a inspiração, a expiração e a inspiração seguinte –, que podem ser feitos em casa e ajudam a relaxar e a melhorar a qualidade de vida.


Inspire e expire quatro vezes
• Durante a inspiração, emita um som do fundo da garganta, semelhante a um sussurro.
• Deixe a expiração acontecer de forma natural e relaxada, sem nenhum esforço, mantendo o mesmo som.
• Em seguida, inspire mais profundamente, mais ou menos duas vezes o volume de ar que você costuma inspirar, mantendo o som no fundo da garganta.
• Expire como das vezes anteriores.
• Repita esse ciclo por quatro vezes. Ao todo, serão 20 respirações conectadas, sendo quatro ciclos, cada um composto de quatro respirações curtas e uma longa.

Em uma semana você começará a se sentir mais vitalizada e com mais consciência de sua própria respiração. Dica – Depois de se habituar à prática, experimente também fechar os olhos. Ao final do exercício, perceba sua audição acontecer, sem qualquer interferência. Isso ajuda a ampliar a percepção interna. Aprenda outras respirações conectadas no site do Instituto de Renascimento de São Paulo, no link www.renascimento. com.br/renascimento/exercicios



Fonte: http://bonsfluidos.abril.com.br/edicoes/0144/autoconhecimento/renascer-propria-vida-620468.shtml

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