sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Este coração que explode - (Roslyn Moore)



"Esta história é uma tentativa de falar sobre o realinhamento de uma vida. Sinto que estou em águas perigosas. Por que será que eu, com todas as minhas limitações, quero escrever uma história sobre mim? Será que estou tentando provar algo? Não deveria ficar quieta e voltar minha atenção para a fonte de todas as histórias? O chamado para escrever é forte. Se eu for sincera, talvez a história seja bem-sucedida e sirva para um bem desconhecido. Eu ofereço esta história ao despertar de todos os seres.

Um cliente, com muita persistência, conseguiu me passar dois vídeos de Gangaji. De acordo com a capa de "River of Freedom" [Rio de Liberdade], um documentário sobre Gangaji, ela é uma mulher americana que foi atraída à Índia em 1990, onde recebeu uma transmissão viva de auto-realização de H.W.L Poonja, um satguru iluminado, discípulo de Ramana Maharshi. Ramana é conhecido como um dos maiores seres iluminados de nossa época. Na capa, Gangaji nos convida a descobrir que já somos Isso que estamos procurando.

As palavras eram intrigantes, mas eu nem pensava que estivesse à procura de uma "Gangaji" em minha vida. Entretanto, mais tarde, depois de assistir aos dois vídeos, um após o outro, fiquei completamente estarrecida. A quietude de Gangaji era tão palpável que eu tinha de conhecê-la.

No domingo de Páscoa de 1996, meu marido, Bruce, e eu assistimos a nosso primeiro satsang público. Satsang quer dizer "associação com a verdade", e Gangaji estava oferecendo satsang, uma reunião aberta gratuita, em San Rafael, na Califórnia. Vieram aproximadamente 300 pessoas.

Sentados em almofadas no chão, Bruce e eu estávamos bem perto da frente do salão, onde havia uma plataforma guarnecida de um pequeno sofá branco muito simples, adornada com buquês de flores e fotos de Sri Poonjaji e Sri Ramana Maharshi. Quando vi a foto de Ramana, especulei se era realmente uma coincidência o fato de Gangaji e Ramana estarem conectados. Quantos anos haviam se passado desde que eu vira, pela primeira vez, uma foto de seu rosto tão expressivo, e sentira algo despertar bem dentro de mim? Este ano mesmo, atraída mais pelo seu semblante do que por seus ensinamentos, eu tinha feito uma cópia xerox e emoldurado uma foto sua, que colocara no altar em nosso quarto. Conseguimos um lugar na frente porque chegamos cedo e esperamos muito tempo. A espera tinha sido prazerosa, do lado de fora, onde o frescor da primavera se misturava à antecipação e reverência de todos na fila. Sabia de antemão que iríamos meditar durante uns vinte minutos, e então Gangaji entraria no salão.

O que vi quando Gangaji entrou na sala não fez sentido algum. Ela era uma mulher de cinqüenta e poucos anos, trajando um vestido azul simples e elegante, e um requintado lenço azul e branco nos ombros. Seu rosto forte e belo, habilmente maquiado, era salientado por cabelos cacheados, provavelmente tingidos e com permanente. Atraente, pensei, mas certamente não era o meu tipo. Não era natural o suficiente.

Mas como a amei de imediato, "meu tipo" teve que mudar. Ou, mais precisamente, descobri que o que a minha mente pensava que eu gostava ou não gostava não significava nada. Algo mais fundo dentro de mim estava ressoando com este ser que inspecionava o salão com uma compostura tão genuína, sorria com tanta sinceridade, e exibia um entusiasmo tão jovial que meu coração se enchia de alegria. Como poderia ocultar qualquer coisa desta mulher, cujos olhos encontravam os meus, tão aberta e completamente, com um "sim" ressonante, enquanto eu tentava analisá-la secretamente, sentada no meu lugar?

Misteriosamente, senti-me como se estivesse vendo a minha própria inocência perdida, minha verdadeira face, perfeitamente fresca, refletida diante de mim. Logo após aquele satsang, fui ao meu primeiro retiro silencioso com ela, em Napa, na Califórnia. Na estância hidromineral de White Sulphur Springs, localizada nos bosques úmidos ao longo de um riacho chamado Sulphur Creek, Bruce e eu penetramos profundamente no silêncio. Só falamos uma vez durante os oito dias que estivemos lá, apenas umas poucas palavras, para esclarecer um engano.

Em Santa Helena, fiquei extasiada quando percebi que, quem quer que tenha inventado o ditado "O silêncio é de ouro", não havia sido uma pessoa tapada e antiquada, com o intento de manter as crianças caladas. Esta moralização tão popular no passado estava apontando para a verdade viva. Foi uma bênção descobrir diretamente o "ouro", o inestimável valor do silêncio.

No silêncio do retiro pode-se ver que todo acontecimento, todo pensamento, toda emoção, toda percepção, se origina de uma vasta ausência de som, um espaço aberto que está sempre presente, mas que geralmente passa despercebido.

Uma experiência que tive naquele retiro, que incluía dois satsangs por dia, precisa ser contada. Em um dos satsang matutinos, realmente vi a compaixão de Gangaji. Era óbvio que, com quem quer que ela falasse, Gangaji via diretamente através da personalidade da pessoa. Uma pessoa estava tentando simplesmente fazer a pergunta certa. Eu estava vendo um homem magro que era intelectual demais, tenso demais, demais isto ou aquilo. Raramente não sentia uma afinidade com qualquer pessoa que falasse com Gangaji, e meus julgamentos estavam me perturbando. Enquanto Gangaji mostrava a tensão desnecessária, estava claro que ela estava vendo alguém que era bonito, sincero e merecedor, sem quaisquer qualificações. Em um nível mais profundo, ela via este homem como o seu próprio ser.

Tive que admitir que sempre tivera uma obsessão pela aparência das pessoas. Na sala de jantar, depois daquele satsang, minha obsessão com minha aparência diante dos olhos das outras pessoas também foi vista claramente. Eu queria mudar, mas não sabia como. Depois de anos de luta, reconheci a futilidade de tentar me tornar mais compassível. Lembrando-me da ordem de Gangaji, parei de tentar. Deixei que a discussão interna fosse reabsorvida no silêncio do retiro.

Uma prece espontânea e fervorosa foi articulada mais tarde naquele mesmo dia: "Que eu possa transcender todo apego às aparências." Mais tarde, enquanto caminhava em silêncio pelo riacho, que corria impetuosamente, houve um momento de revelação, que me atravessou como uma golfada de vento.

Um rio de seres havia passado pela minha vida inteira, um fluxo interminável de indivíduos aparecendo na consciência. Eu podia vê-los mergulhando e voltando à tona no rio. De repente, soube (com um saber perfeito) que todos estes seres eram o mesmo ser. Então, da mesma maneira que fui inundada pela alegria de reconhecer isso, tive certeza de que este ser era o meu próprio ser. Meu próprio ser!

Naquele momento, meu coração se expandiu e eu senti que estava pronta para morrer. Filtrado, o pensamento era mais ou menos esse: "Se eu morrer agora, não tem problema, porque agora esta vida valeu a pena ser vivida." Mas, naquele momento, eu morri de verdade. Em um instante, desisti de minha vida inteira, pela verdade que estava sendo revelada.

Quase imediatamente notei um desenvolvimento revoltante. Poucos momentos após a revelação, minha mente começou a tentar imaginar uma maneira de usar esta revelação em benefício próprio. Foi chocante assistir à minha mente tentando diligentemente construir uma auto-imagem melhor, uma imagem à medida de alguém que tivesse tido uma experiência tão elevada.

Durante aquele primeiro retiro, tive a boa sorte de, em muitos momentos, estar consciente de não ser ninguém em particular. Tais momentos foram inesperadamente agradáveis. Foi exatamente como Gangaji tinha prometido. Estar vazia de "mim" não era vivenciado como uma ausência, como eu imaginara, mas como a mais verdadeira alegria. Minha compreensão do funcionamento da minha mente estava crescendo. O ambiente silencioso do retiro me deu a oportunidade de conferir empiricamente a minha mente pensante, e descobri que não podia confiar nela de modo algum. Vi que todo pensamento, por mais esclarecido que fosse, era seguido de outro pensamento, e depois de outro pensamento, e mais outro pensamento. Eu estava vendo o que Ramana viu. Não há nenhum pensamento verdadeiro, com a exceção de um. E esse é "Pare! Fique quieto!" Cerca de seis semanas depois do retiro tive uma experiência profunda de iluminação. Gangaji descreve as experiências de iluminação como experiências que estão em alinhamento com a Verdade Absoluta. Elas são eventos abençoados, a serem lembrados carinhosamente por toda vida. Ainda assim, são apenas experiências, e todas as experiências, ela lembra impiedosamente, vão e vêm.

Bruce e eu fomos a um pequeno satsang em Stinson Beach, em uma sexta-feira. Em um determinado momento, logo depois que começou, de maneira completamente inesperada, Gangaji olhou diretamente para mim e disse: "Você reconheceu a verdade do seu ser. Vejo isto claramente. Isto não pode ser escondido. Você tem uma tendência ou um padrão de autodiminuição. Não sei o que é. Talvez seja alguma crença no seu não-merecimento, ou algum mau uso de poder no passado, ou algo assim. Mas não importa. O que importa é que você percebe a verdade."

"Vou lhe contar o que Papaji me disse quando viu esta mesma autodiminuição em mim." Ela imitou a postura física, deixando cair os ombros e fazendo seu corpo parecer menor e seu rosto parecer estúpido. "Papaji disse:" e voltou à sua postura normal, 'Sem Restrições!' Este é o meu conselho para você. Você entende? Não tente se fazer menor do que o que reconheceu que é verdadeiramente."

Eu fiquei estupefata. Especulei se tinha sido escolhida por engano, dentre uma série de nomes em uma lista. Mas não tão estupefata a ponto de não dizer, mais adiante no satsang: "Gangaji, você tem mais alguma dica para mim sobre a autodiminuição?" Novamente o seu olhar direto: "Não, você entendeu tudo que eu disse perfeitamente." E eu tinha entendido. Só que havia aquela voz de elogio e culpa, tentando diligentemente decidir se o que ela me dissera me elevava, "Você é auto-realizada", ou me diminuía: "Você se vê como alguém sem valor, e agora seus medos estão expostos e todo mundo vai saber que você é insignificante." Que oportunidade para ver minha bagagem, na clareza de sua presença, e deixar que tudo se queimasse.

Nas duas manhãs seguintes, quando acordei no quarto de dormir em Berkeley, vi conscientemente o momento em que minha mente se tornava ativa, como se eu fosse um brinquedo mecânico que tinha sido ligado na tomada. Então, misteriosa e espontaneamente, vi que despertei novamente, mas desta vez estava despertando de tudo o que pensava. Eu me expandi e soube que este fluxo mental não era nada além de um ponto de luz em uma tela. Quem eu sou é um espaço vasto e interminável. Espaço preenchido pela cama, pelo canto dos pássaros, os galhos das árvores do lado de fora da janela, por mim. Eu vejo o espaço aberto e vejo as formas que emergem no espaço, mas não qualquer distinção real entre coisa e não-coisa.

Não há verdadeiramente nenhuma separação. Nenhum aspecto de "mim" está em oposição à vacuidade da qual é feito. Eu não existo. Mais precisamente, eu sou a própria existência. Eu incluo tudo que vejo e tudo que não vejo. Eu não sou limitada pelo surgimento de "mim". O surgimento de "mim" é impregnado de quem eu sou verdadeiramente.

Havia uma alegria e confiança insondáveis, resultantes da percepção direta. O véu tinha sido levantado. Não era mais possível retornar à minha falta de compreensão anterior. O que eu tinha ouvido Gangaji dizer, e o que tinham dito os Grandes Mestres, agora eu sabia que era a verdade. Sem dúvida. Não sabido pela mente, mas conhecido diretamente, por experiência própria.

Mais tarde, uma dúvida surgiu. Eu não duvidava do que tinha visto, mas de que poderia alinhar corretamente a minha vida com a perfeição que tinha sido revelada. De fato, pensei que estava fazendo um trabalho malfeito, e uma espécie de tortura mental se iniciou.

Através de uma graça, eu tinha recebido o presente incomparável de saber a verdade. Será que eu não tinha a responsabilidade monumental de ser um testamento vivo do que recebera? Tendo aceitado a responsabilidade, como poderia estar entretendo este fluxo de humores, pensamentos e emoções que continuavam a aparecer? Em suma, por que eu não era feliz?

Quando já não podia mais suportar a tensão da separação aparente, desabalei-me para um pequeno satsang, para falar com Gangaji sobre isto. A caminho, fui forçada, de uma vez por todas, a ver a inutilidade de tentar entender Isso. Durante a viagem de carro de quatro horas até Stinson Beach, minha mente dava voltas implacavelmente. Eu estava desesperada, queria entender o que estava fazendo de errado. Por fim, tornou-se óbvio que eu não ia entender nada e, finalmente, tornou-se óbvio também que eu estava enlouquecendo com minhas tentativas. Então, por pura necessidade, desisti. Completamente. E então houve paz.

Agora, sempre que percebo que estou dizendo a mim mesma que tenho que entender isto, que é importante entender aquilo, ou que preciso chegar ao fundo de algo mais, este momento é um chamado que me convida a parar. Parar e me render ao que existe neste momento, independente de quaisquer detalhes que minha mente esteja inventando. De repente, e inesperadamente, percebi instantaneamente que tinha uma imagem em minha mente de como é ser feliz. A imagem surgira quando eu era ainda muito jovem e permanecera inalterada. Ao ver uma foto minha aos sete anos, na qual eu estou dando pulinhos de alegria na calçada, com um semblante feliz, só podia mesmo desistir. A aparência de Roslyn, quando se sentia feliz e realizada não podia ser modelada de acordo com uma imagem infantil de felicidade. A imagem era uma obstrução à possibilidade da verdadeira felicidade.

De repente, soube que teria que abandonar todas as imagens que estavam ocultas em meu subconsciente. Mas como? A "Roslyn" não era nada além de uma coleção de fixações: medos e desejos. Este foi um reconhecimento poderoso de como era sério o problema. Não havia escapatória.

Apesar da aparente impossibilidade, ou talvez por causa dela, eu rezei. Fiz um convite de todo o coração, a que todas minhas imagens ocultas se revelassem. Por mais apavorantes que fossem, aonde quer que tivessem sido socadas. Agora tinha a sensação de que estava pronta, de que finalmente sabia o que fazer. Este saber não vinha da minha mente, mas do âmago do meu ser. Eu me casaria com a Verdade. Seria um verdadeiro matrimônio. Minha imperfeição era secundária. Qualquer coisa que surgisse e por mais tempo que levasse, esta relação entre mim e a Verdade permaneceria imutável.

Quando anunciei meu matrimônio no pequeno satsang, Gangaji me disse que tinha esperado por isto, embora não conscientemente. Ao término da reunião, quando os comes-e-bebes foram servidos, ela disse brincando que era hora de servir o bolo de casamento. Umas duas semanas depois do pequeno satsang, comecei a escrever um pequeno relato a Gangaji em minha mente, como freqüentemente fazia naqueles dias. As palavras surgiam espontaneamente. "Amada Gangaji, 'eu' e 'meu' continuam sofrendo, mas eu permaneço intacta." Sim, era isso. Isso descrevia a minha experiência exatamente.

Sentei-me confiante à minha escrivaninha. Foi fácil escrever a parte sobre continuar sofrendo. Saiu voando da minha caneta. Surpreendentemente, quando comecei a escrever as palavras "eu permaneço intacta", minha caneta parou de se mover. Foi realmente chocante ver quanta resistência eu sentia a escrever essas palavras especificas, a pronunciá-las alto para Gangaji. Era como se, ao dizê-las, eu estivesse negando toda a minha vida passada, as minhas vidas passadas, de sofrimento. Não só isso, mas eu teria que admitir, antecipadamente, que qualquer sofrimento que pudesse acontecer no futuro tampouco poderia me atingir. Porque, se eu permanecia intacta, quem estava sofrendo? Ocorreu-me que talvez eu tivesse investido demais neste eu inexistente, neste sofredor inexistente, em abandoná-lo. Eu não estava pronta. Eu escreveria outra coisa a Gangaji, ou não escreveria nada.

Então ouvi a sua voz claramente: "Simplesmente diga a verdade!" A pura verdade era que eu permanecia intocada por qualquer sofrimento pessoal, passado, presente, ou futuro. Assim eu ganhei coragem e contei a coisa do jeito que era, e um peso enorme foi aliviado.

Depois do retiro em Santa Helena, concluí que as bênçãos que recebera lá eram um resultado direto do silêncio. Então, é claro, quando cheguei a Crestone, no Colorado, para o meu segundo retiro de silêncio com Gangaji, eu já antecipava um encontro importante com o silêncio.

Em Crestone, eu estava cercada de montanhas cobertas de neve, um céu de um azul intenso, uma sinfonia de nuvens, as árvores, a terra deserta, e uma consciência do espaço. Em vez de me hospedar no local do retiro, onde poderia simplesmente atravessar a estrada para ir ao restaurante e ao salão dos satsangs, decidi montar uma barraca em um acampamento que ficava a uns cinco quilômetros de distância, uma caminhada cheia de subidas e descidas. Ainda em casa, tinha considerado meus apetrechos de acampamento cuidadosamente; tinha praticado armar minha barraca no gramado em frente à nossa casa. Mas, depois de uma noite completamente insone em meu colchão inflável que se esvaziava cada vez mais, decidi que acampar, pelo menos a uma altitude de 2.500 metros, nestas circunstâncias, não era para mim.

Felizmente, pude alugar uma tenda fixa de um homem que estava no retiro, por um preço módico. Naquela noite, a temperatura baixou até 1 grau centígrado e, embora estivesse usando várias camadas de roupas e deitada debaixo de vários cobertores, meu nariz estava frio demais para eu conseguir pegar no sono.

Em seguida, dei um jeito de mudar para um apartamento pequeno na mesma propriedade. Tudo isso envolveu um bocado de atividade, muita mudança, e muita conversa. Acrescente-se a isto uma viagem até um templo hindu, com um amigo que não parecia ter qualquer idéia de que o retiro era em silêncio, e você pode ver que a minha expectativa de que o retiro seria de um silêncio externo perfeito, que apoiaria minha quietude interna, estava se mostrando estar incorreta.

Fiquei surpresa e achei divertido ver que as coisas não estavam se desenrolando como eu esperava. Não obstante, estava me divertindo a valer e jamais poderia esperar ter uma experiência mais linda. Eu estava fisicamente perto de Gangaji, assistindo a dois satsangs por dia com ela. Um privilégio sem igual. Eu estava em um lugar sagrado e muito especial. No satsang no domingo de manhã, tive a grande sorte de falar com Gangaji. Eu estava sendo dissolvida pela graça.

Hoje é domingo, 25 de maio, e este é o terceiro satsang do Retiro de Crestone. Estou sentada no chão e sei que hoje vou levantar a mão. Sei até mesmo que serei chamada. Pretendo descrever para Gangaji a experiência de "despertar" que tive em Berkeley. Pergunto-a mim mesma por que este encontro é tão importante para mim, mas não sei a resposta.

O tempo que passo aguardando ser chamada por Gangaji é intenso, e provoca uma mudança em minha vida. É um tempo carregado energeticamente. Enquanto as duas primeiras pessoas falam, imagino como será quando eu estiver lá em cima. Como vou me comportar? Será que vou parecer inteligente? Iluminada? Completamente ridícula? Tenho medo de que as pessoas terão inveja das minhas experiências e não gostarão de mim. Esta é a primeira vez que vou falar com Gangaji em um satsang grande. Sei que a excitação de ser o centro das atenções e o medo de me expor não têm importância.

"Simplesmente seja fiel à verdade", digo a mim mesma. Repito estas palavras freqüentemente. Sempre que começo a imaginar o que poderá acontecer quando eu estiver no palco, com o coração palpitando, retorno àquelas palavras: "Simplesmente seja fiel à verdade, e se renda."

Agora estou sentada com ela. Com a nova disposição no palco, com duas cadeiras uma próxima da outra, é como estar na sala de estar de Gangaji. Estou muito feliz de estar com ela, ser vista por ela, e vê-la. Ficamos de mãos dadas por um bom tempo. Oceanos de amor e reconhecimento. Não consigo parar de sorrir.

Eu:
Bem, eu tive uma experiência há mais ou menos um mês e acho que preciso contá-la e depois você me diz... Nem que seja só para contá-la e esquecê-la, tudo bem, mas ela tem que ser contada.

Gangaji:
Ótimo. Não posso negar isso.

Eu:
Aconteceu em duas manhãs seguidas: eu acordei de manhã e foi como se eu estivesse saindo do sono e sendo ligada em uma tomada, como se fosse uma coisa mecânica, e então eu estava acordada.


Estou tentando fazer os gestos de um brinquedo mecânico e não faço a menor idéia se os pequenos movimentos abruptos das mãos e as contorções faciais que estou fazendo estão comunicando o que eu quero expressar.

Continuo, sem saber se as minhas palavras estão sequer comunicando isso. "Os pensamentos e tudo mais, sabe, simplesmente começaram a acontecer. E então eu acordei novamente." Quando Gangaji responde com um "Ah!" espontâneo, sei que ela está me entendendo e me incentivando a continuar.

Eu:
E então despertei de novo. Despertei! E eu nem mesmo estava presente. É difícil de falar, mas eu só quero falar sobre isso.

Gangaji:
Sim, eu quero que você fale.

Eu:
É como se as coisas estivessem ao redor de mim, e nós éramos todos a mesma coisa.

Gangaji:
Nós, coisas?

Eu:
Nós, coisas, éramos todos o mesmo.

Gangaji:
Sim.

Eu:
E se podia ver o espaço entre as coisas, que não estava exatamente entre elas, porque o espaço e as coisas eram todos o mesmo. Completamente. E eu... Meu primeiro pensamento foi que eu não existia, e meu segundo pensamento foi que eu sabia que era isso que eu era. Era isso que eu era. Completamente.

E tudo mais simplesmente não existia... Sabe, simplesmente não existia... Tudo o que você pensa, não existe.


Ouço pessoas rindo no salão. Acho este negócio de conversar com Gangaji no palco muito agradável. Meus olhos se fecham para eu poder retornar à sensação. "E eu sabia que eu não tinha começo nem fim, e que eu era o todo. E queria lhe agradecer por isso." Gangaji recusa com um gesto, e ficamos rindo, e ouço risadas vindo de todos os lados.

Eu:
Só para... Eu sei que você vai dizer... Quero dizer eu senti... Senti tanto que isso estava acontecendo através da sua graça, senão por que isto aconteceria? Você tinha me dito no dia anterior...

Gangaji:
É verdade que você recebeu a transmissão. E a única maneira de esquecê-la é se você tentar se lembrar dela como uma coisa. Como um acontecimento. Se tentar fazer da experiência da totalidade do ser o ponto de referência para a memória.


Sei exatamente o que ela quer dizer porque tentei isso, e por isso estou rindo. Quando vê isto Gangaji diz: " Ótimo. Você já tentou isto. Isto é maturidade. Você já tentou e viu a sua inutilidade." Ela tem toda a razão, e novamente rio, em reconhecimento. Digo a ela que já tentei de tudo

Gangaji:
Isso é maturidade espiritual. "Já tentei de tudo." E agora, nada. Agora, a vigilância. A resolução. Viver sendo fiel à verdade. Como quer que ela se apresente. Qualquer que seja a experiência. Sim, estou profundamente feliz por você falar sobre isso, que isto tenha acontecido. Agora você sabe, por sua própria experiência, o que eu tento dizer inutilmente.

Eu:
Exato. Se há uma coisa que eu poderia dizer, ao falar disso com outra pessoa, é que isto não é uma metáfora. Eu achava que era... Mas não é uma metáfora.


Isto é recebido com risos calorosos, e sinto que Gangaji e eu nos entendemos perfeitamente, quando ela afirma claramente que "não é uma metáfora."

Quando o salão muito quieto, Gangaji me agradece de todo o coração e diz que sem receber não se pode dar, e eu lhe agradeço de todo o coração. Há algo muito sólido na maneira como ela olha para mim e diz: "Ótimo" e então eu desço da plataforma.

Enquanto me dirijo de volta ao meu lugar, há uma pausa muito longa. Os olhos de Gangaji estão fechados. Quando se abrem, ela diz: "Esta é a consciência de Ramana. A consciência daquilo que está vivo no âmago de todos os seres, e que se reconhece como ISSO. Não através de esforço, ou pela tentativa de se lembrar, ou fazer algo. Não indo em busca ou evitando alguma coisa. Simplesmente despertando enquanto se está acordado."

Quando retorno ao meu lugar no chão, sinto como se, de algum modo, Gangaji tivesse me libertado. A essas alturas, já tinha descoberto que não há nenhuma possibilidade de se aterrissar em lugar algum, mas eu previra que, ao contar o que estava acontecendo comigo, Gangaji daria um sentido a tudo aquilo. Em vez disso, estou queimando. Gangaji me acendeu. Desde o momento em que saí do lado dela, é como se houvesse fogos de artifício, uma explosão de reconhecimento depois da outra.

Não há mais espaço para a vozinha egocêntrica que diz: "Nossa! Ela disse que eu recebi a transmissão? Oba! Agora sim!" Como odeio a vozinha, empurro-a para debaixo da superfície da consciência. Não só isso, mas confundo este ato de repressão com vigilância.

Deitada de costas em meu quarto, aberta, quieta, com uma grande sensação de vivacidade, mergulho na experiência da totalidade mais profundamente. É tão incrivelmente próxima. Eu estou procurando cuidadosamente a separação entre o que está dentro de mim e o que está fora de mim, e não consigo encontrá-la. O que pensava que era importante não é importante.

O que pensava que era insignificante, porque sempre fora verdade e não exigia minha atenção para ser verdade, é o que eu estou examinando agora.

Vejo que há somente um campo. A idéia de que eu sou a parte que está dentro deste corpo, e não a parte que está fora deste corpo, é completamente absurda. Que tolice ter atribuído tanta importância à aparência da pele como um limite significativo. Que diferença meros fenômenos físicos como sangue, tecido, órgãos, ossos, podem fazer neste vasto oceano de consciência?

Tento encontrar o limite entre dentro e fora, o limite entre mim e o silêncio, o limite entre mim e o outro. Não há palavras. Não há tempo. EU SOU CONSCIÊNCIA ILIMITADA. Estou me dissolvendo em ondas de bem-aventurança. Uma ondulação em expansão constante. Imensa. Orgástica. Delicada. Sutílima.

Ao anoitecer, tenho o pensamento de que talvez seja realmente a bem-aventurança que eu quero, afinal de contas. Como posso organizar minha vida de modo a ter mais bem-aventurança? Mudar-me para a Índia? Achar uma caverna? Gangaji me preveniu sobre a bem-aventurança, a grande sedutora. Querer a bem-aventurança, querer qualquer coisa, só pode me afastar do auto-reconhecimento.

Quando o medo surge, o medo de perder o estado desperto, descobre-se que ele se baseia em falsos pressupostos. Como posso perder qualquer estado, quando todos os estados já estão aqui?

Noto que a palavra "eu" continua a surgir. E todavia não há nenhum "eu". Eu sou a iluminação. Sou a ignorância. Sou todas as coisas e todas as não coisas. Que problema se tornou esta palavra!

Toda a estrutura do meu sistema de crenças está desmoronando. Vejo que todas as minhas convicções se baseiam na falsa convicção de que o que está dentro do meu corpo está separado e é mais importante do que a totalidade de mim. A partir desta falsa convicção, eu construí um universo inteiro. Criei comparação, avaliação e julgamento. Penso em alguém que conheço, que sei que é ignorante. É como se fosse meu primeiro julgamento, e eu o vejo pelo que é realmente. Eu sou esse mesmo "alguém". Vejo que todas as rivalidades mentais são imaginárias. Agora que se soltou o laço mais apertado do nó da identificação equivocada (a identificação de mim mesma como sendo um corpo), tenho uma confiança renovada em que todos os laços relacionados a ele vão se soltar naturalmente na consciência. Aleluia! Agora eles podem simplesmente se desenrolar na imensa tela da consciência.

A caminho do salão de refeições, para o café da manhã, deleito-me com a presença das montanhas, das árvores, a luz e a sombra, o céu. Esta vida vibrante é infinita! Lembro-me de um velho medo de que, se eu superasse todos os meus apegos, a vida seria um tédio. Eu rio. Pela primeira vez, tenho um vislumbre da verdadeira possibilidade. Quando tudo é "eu mesma", o enfoque da minha atenção se amplia e inclui tudo, sem limitação. Eu sou apegada a tudo. A possibilidade de descoberta é infinita. A possibilidade de amor é infinita.

Dou uma outra boa risada quando entro na sala de jantar. Percebo que estou levemente embaraçada. Num instante, entendo a piada. Eu não sou ninguém, e este ninguém pensa que é alguém! Que bela peça estou pregando em mim mesma.

A sensação de ser inundada por reconhecimento continua. Um "aha!" depois do outro irrompe do silêncio desperto. "Aha! Vigilância não é aquela voz que censura meus pensamentos e me diz o que não pensar. Não. É simplesmente render-se à verdade de quem eu realmente sou, a cada momento."

Agora é terça-feira de manhã. Ao contrário de outros retiros silenciosos, neste haverá dois encontros nos quais todos os participantes do retiro conversarão uns com os outros. Eu me inscrevi para participar de um grupo chamado "Satsang na Vida Cotidiana". Muitas pessoas escolheram o mesmo grupo, tantas que nem vamos caber todos numa sala só. Fui designada para o Grupo dos Excedentes. Após dois dias de revelação, reluto em me dirigir à reunião. Em dialeto psicodélico, não quero "cortar o barato". Não sabendo se irei ou não, descubro a casa onde a reunião acontecerá, e então vou passear no bosque. E percebo que estou retornando à casa.

Quando entro na sala, vejo que esta não será uma reunião convencional. A discussão é sobre ir ou não a uma estação de águas térmicas local. Aparentemente, a noção de realmente discutir a questão do satsang na vida cotidiana já fora descartada.

Olho ao redor da sala. À minha esquerda, estão dois jovens de cabelos longos, Jimmy e Michael. Eu não tinha notado Jimmy antes, mas Michael falara com Gangaji em satsang no dia anterior. Ele tem um corpo grande e relaxado, um sorriso espontâneo, e me parece imaturo. À direita deles está Paldrom. Presente, modesta e sábia, ela trabalha na Satsang Foundation [Fundação Satsang] e talvez seja a facilitadora responsável pelo grupo. Carol é do sul. Com cabelos louros ondulados e um ar de sinceridade, ela me lembra Gangaji. Lelia é o meu verdadeiro amor. Quando olho em seus olhos claros e luminosos, afundo neles. Todos nós nos apresentamos, e percebo que me apresento excentricamente como "não". A conversa flui livremente. Três de nós falaram com Gangaji em satsang e descrevemos o encontro. Terapia de Satsang, como diz Carol. Quando falo, sinto que Jimmy e Michael estão zombando de mim. Jimmy me pergunta sobre a experiência que descrevi a Gangaji quando falamos no domingo e diz, descartando-a: "Ah, você ainda estava vendo objetos, portanto não foi uma experiência de nirvikalpa samadhi." Diz que já esteve naquele estado, ou algum outro estado com um nome em sânscrito que não conheço, durante vários dias.

Digo que foi importante para mim o fato de Gangaji ter me dito que eu tinha recebido a transmissão, e Jimmy sussurra para Michael que eu não podia ter acreditado que Gangaji estava falando sério quando disse isso. Será que eu não tinha visto aquele sorriso trapaceiro em seu rosto enquanto ela falava comigo? Quem era ela para transmitir o quê para quem?

Não posso acreditar no que está acontecendo. Eu não sabia o que esperar depois das ocorrências dos dois últimos dias. Eu seria possivelmente identificada como alguém que tinha se realizado e seria tratada com reverência, ou talvez ninguém notasse. Estava preparada para ambas as possibilidades. Mas não para isto. Olho para as mulheres. Nem Carol nem Paldrom parecem se lembrar da conversa que tive com Gangaji. Lelia diz que foi muito importante para ela. Diz que quando Gangaji e eu conversamos, ela viu faíscas de luz saindo de nossas cabeças e iluminando a sala.

Quando temos um intervalo para o almoço, não sei se voltarei para a reunião da tarde. Não quero admitir o que estou sentindo. Humilhação. Raiva. Quando penso em Jimmy, percebo que o detesto. Parece que há anos eu não tinha uma reação tão forte a alguém. Volto para o meu quarto e vou para a cama. No início, estou desesperada. Como posso estar num estado tão desprezível? Depois, abandono o desespero, apenas o suficiente para investigá-lo. Vejo que aquela emoção forte surgiu quando o pensamento de que eu era iluminada ou auto-realizada, ou pelo menos era melhor do que antes, fora desafiado. Eu paro. Tenho a sensação de que a contração está pairando sobre mim. Abro-me a ela.

Na verdade, eu tinha visto um sorrisinho no rosto de Gangaji quando conversamos, não tinha? Para mim, ela estava não apenas confirmando a transmissão, mas também comunicando de maneira não-verbal que ambas estávamos apenas jogando um jogo uma com a outra, o jogo de professor e aluno, de guru e discípulo. Ela estava me informando que a auto-importância que eu estava trazendo para este jogo era desnecessária. Mas naquela altura, eu não estava pronta para reconhecer isto. Aquele aspecto de mim que queria usar as experiências de iluminação para elevar a minha auto-imagem não queria ser desalojado.

Eu vinha notando um certo orgulho de proprietária em relação às experiências que estava tendo, e tinha esperanças de que, para lidar com ele, bastaria estar consciente dele. Mas este orgulho era recalcitrante. Ele tinha camadas. Por trás do orgulho estava o orgulho do orgulho. Este orgulho não significava que havia algo correto a meu respeito, algo de que me orgulhar, já que eu estava tendo que lidar com ele? Sem me mover, deixei toda a devassidão penetrar até o fundo.

Um sorriso enorme se abriu em meu rosto. É simplesmente engraçado demais para eu poder manter a minha seriedade. A astúcia da mente egóica! Gangaji tinha razão. A declaração de união com Deus é um convite a todos os velhos fantasmas para que saiam das trevas. Mas também é certo que eles vêm somente para serem liberados.

Quando volto ao grupo, à tarde, todo mundo me parece belo. O que eu percebera como sinal da imaturidade de Michael, agora vejo como uma brincadeira amável. Cada um de nós está desempenhando seu papel totalmente. Juntos, iniciamos em uma peregrinação aos centros espirituais em Crestone. Quando andamos ao redor de um pagode budista tibetano, seguimos no sentido horário, como prescrito, com exceção de Jimmy, que segue no sentido oposto. Ele é o coiote. Eu agradeço ao coiote, em meu coração, pelo rude despertar que recebi. Este tempo que passamos juntos é glorioso. O Grupo dos Excedentes está transbordando de amor.

No dia seguinte ao dia em que Gangaji e eu conversamos, Gangaji disse em satsang que mesmo este negócio de despertar, até mesmo este negócio de iluminação, existiam dentro da leela [jogo divino]. Eu estivera ponderando o que as suas palavras significavam, tentando compreendê-las, usando a minha idéia conceitual sobre a iluminação como o ponto de chegada. Agora elas fazem sentido perfeitamente. Tanto a experiência de despertar quanto a experiência de sofrimento são fenômenos que surgem da mesma fonte imutável. O desafio não é ter mais experiências de iluminação, por mais reveladoras que sejam. O desafio é permanecer quieto. Não se mover da quietude, que é naturalmente aberta e determinada, seja qual for a experiência.

Paldrom tinha me contado que uma vez havia dito a Gangaji que nada de extraordinário jamais acontecia com ela, e Gangaji disse que nada precisava acontecer, que ela já sabia. Foi importante ouvir isso. Pensei em uma querida amiga de satsang, que mora na minha cidade, que estava despertando para a verdade do seu ser. Ela também me dizia que em sua história não havia fogos de artifício.

Dois dias depois do Grupo dos Excedentes, na tarde de quinta-feira, há um satsang em que tantas pessoas levantam a mão para falar com Gangaji, que me faz pensar em um frenesi de alimentação. Fico muito contente quando Gangaji pede para Amber cantar. Toda vez que Amber parece ter terminado, Gangaji pede, com uma voz infantil adorável: "Mais?" Ela faz o mesmo com Dana. Em seguida, com Al e Yani. Até aparecer a quarta cantora, uma mulher chamada Kirtana, eu tinha concluído que não poderia haver nada melhor. A consciência do grupo está elevada.

Não reconheço Kirtana quando ela se aproxima da plataforma com seu violão. Tenho a impressão, por sua breve conversa com Gangaji, que a última vez em que haviam conversado fora perturbadora para Kirtana. A conversa delas não me prepara de forma alguma para a canção de abertura de Kirtana, que ela está cantando pela primeira vez para Gangaji. A sua voz sussurrante me convida a escutar cada palavra atentamente.

Antes do corpo
Antes da história
Antes do nome
Além da tentativa
Da mente de achar
Ou explicar
Antes da respiração
Além da sensação de prazer ou de dor
E após a morte
E após a morte
Eu existo.
(copyright 1997 Wild Dove Music)

Que beleza! Estou chocada. Sei mais profundamente agora como foi tolice pensar que o abençoado reconhecimento refletia algo sobre a minha pessoa. Quando o Satsang Cantado termina, coloco uma nota no quadro de avisos: "Estou completamente humilhada. Eu amo todo mundo aqui."

Quando me inscrevi no retiro, fiquei decepcionada ao descobrir que o tema seria "Uma vida vivida a serviço da verdade" e que o programa incluía algumas reuniões faladas. Eu pensava que um retiro deveria ser em silêncio. Ao confirmar a minha presença, percebi que dois satsangs listados no Calendário de Eventos tinham o mesmo título, e fiquei imaginando quem os conduziria. Estava receosa que fosse Maitri, a diretora da Satsang Foundation & Press [Fundação e Editora Satsang], ou um grupo de membros da diretoria. Eu esperava, porém, que fosse Gangaji. Seria uma pena perder dois satsangs formais com a Amada.

No começo da semana, quando nos reunimos para o primeiro desses dois satsangs, Maitri se senta na cadeira de Gangaji. Ela está radiante. Não sinto a sensação antecipada de decepção. Na verdade, há uma abertura. É emocionante vê-la. Maitri nos convida a responder ao chamado de servir que é inerente ao nosso encontro com Gangaji. Da mesma forma que Gangaji, ela nos assegura que as possibilidades são infinitas, e não há como prever de que forma cada indivíduo atenderá a este chamado.

Reconheço a existência deste chamado mais profundo. À medida que se desenrola o retiro, fico impressionada com a sua força. Enquanto isso, algo incrível acontece. Depois de décadas tentando alcançar a iluminação pessoal, descubro que já não estou mais tentando. Não estou pensando em quão iluminada eu sou, ou quão iluminada é qualquer outra pessoa. Este hábito, como mais tarde verei, está terminado.

Será possível que o fim do desejo de iluminação pessoal abra espaço para um desejo mais profundo, o desejo de servir? Não sei. Mas na quinta-feira, estou incendiada por ele. Estou pensando se há alguma arrogância na idéia de ser casada com a Verdade, porque agora sinto que quero somente ser a Serva da Verdade. Como acontece tão freqüentemente, Gangaji aborda exatamente esta questão no satsang seguinte.

"Estou falando do nível de compromisso que reconhece que, qualquer que seja o sentimento, qualquer que seja a experiência, existe um laço de amor verdadeiro entre a alma e Deus, entre você e a Verdade, com a qual sua vida está casada. Como esposa, como a esposa tradicional à moda antiga. Não como uma parceria fria, não como o líder, mas como a esposa. A esposa aguardando a oportunidade de servir, esperando que lhe digam o que fazer, aguardando para seguir uma ordem." Sim! Este é exatamente o relacionamento para o qual eu estou despertando.

Antes de deixar o retiro, ofereço-me à Fundação como voluntária, para fazer qualquer trabalho que possa ser feito à distância. Também decido comprar um computador, algo a que resistira durante anos, pensando que isso me dará a possibilidade de fazer mais. Que bênção para mim encontrar-me neste retiro em especial, com o tema de serviço. Quando deixei Crestone, minha vida se tornou uma simples prece consciente de que eu possa ser aproveitada. De fato, vejo agora, é por isso que estou escrevendo esta história.

Sou eternamente grata que esta prece perfeita, que existira o tempo todo, tenha finalmente me encontrado. Compreendo que, de algum modo inexplicável, não existe separação entre uma prece feita de todo coração, para que se possa servir à verdade, e a sua realização. Não existe separação entre a prece eterna, sua segura realização, este coração que explode e mim."

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